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sexta-feira, 17 de junho de 2011

O Negro É...

A raça negra é amaldiçoada? – uma reflexão teológica sobre 

as supostas declarações racistas do pastor Marco Feliciano no Twitter.

O final do mês de março foi marcado por intensa polêmica no universo virtual acerca da declaração postada no Twitter pelo Deputado Federal (PSC-SP), pastor Marco Feliciano. A página da UOL Notícias destacou: “Deputado federal diz no Twitter que ‘africanos descendem de ancestral amaldiçoado". Em seguida a UOL trouxe o post com as declarações de Feliciano, conforme aparecem em seu Twitter: “Africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé. Isso é fato. O motivo da maldição é polêmica. Não sejam irresponsáveis twitters rsss”.
Ainda de acordo com a UOL, o parlamentar, que é pastor e empresário, afirmou que:
“Sobre o continente africano repousa a maldição do paganismo, ocultismo, misérias, doenças oriundas de lá: ebola, Aids. Fome...”
Antes, o pastor evangélico disse que a maldição sobre a África supostamente provém do "1º ato de homossexualismo da história". "Sendo possivelmente o 1o. Ato de homossexualismo da história. A maldição de Noé sobre Canaã toca seus descendentes diretos, os africanos", afirmou também.
Em entrevista por telefone, Feliciano disse que as mensagens foram publicadas por assessores, sem a sua aprovação. O parlamentar afirmou também que não considera as mensagens racistas. "Não foi racista. É uma questão teológica", disse. "O caso do continente africano é sui generis: quase todas as seitas satânicas, de vodu, são oriundas de lá. Essas doenças, como a Aids, são todas provenientes da África", acrescentou.
Hoje, quase 20h depois das declarações, o deputado negou ser racista também no Twitter. "Tenho raízes negras como todos os brasileiros. Bem como dos índios e também europeus! Rejeito essas calunias infames! Aqui não seus desalmados", disse Feliciano.
Marco Feliciano foi eleito deputado federal nas eleições do ano passado, com mais de 211 mil votos, e diz ter 30 mil seguidores no Twitter. "Sou afro descendente, meu nariz é largo, meu cabelo é crespo. Tenho apoio do líder do movimento dos negros, pastor Albert Silva, de São Paulo", defendeu-se.”
Este comentário da UOL provocou um “efeito cascata” na rede virtual. De repente dezenas de blogs e sites passaram a taxar de racistas a declaração do parlamentar evangélico. O site: peticaopublica.com.br, imediatamente saiu à procura de assinaturas para um Abaixo-Assinado em favor da cassação do deputado por quebra de decoro parlamentar. O site justifica o recolhimento de assinaturas, que deverão ser encaminhadas à Comissão de Direitos Humanos da Câmara, da seguinte forma :
“O deputado, embora tenha tentado alegar que as mensagens foram postadas em seu twitter por assessores sem a sua autorização, reiterou as mesmas idéias contidas na mensagem publicada, tentando esquivar-se das críticas ao afirmar que não se tratava de racismo, mas sim de “questões teológicas”, como se a religião pudesse servir de pretexto para que se ataque camadas da população impunemente.
Diante dessa clara e lamentável manifestação de racismo e homofobia nós, membros da sociedade civil, exigimos a cassação do mandato do parlamentar em questão, bem como as sanções legais cabíveis por crime de racismo e quebra de decoro parlamentar.
Não vamos admitir que os deputados se valham de sua imunidade para cometer crimes e desrespeitar camadas da população enquanto recebem salários custeados com o nosso dinheiro”.
O jornal O GLOBO pôs em destaque o fato com a manchete: “Deputado federal Marco Feliciano faz cora às declarações de Bosonaro e ataca negro e homossexuais no Twitter”.
De acordo com o JORNAL DO BRASIL, a Frente Parlamentar pela Igualdade Racial também irá analisar o conteúdo das declarações do deputado para “investigar possíveis manifestações racistas”.
Já o site O GALILEO traz o pronunciamento do deputado, conforme postado em sua página na internet. Aqui reproduzirei apenas a parte que será objeto da minha análise:
“Após algumas horas de uma postagem na internet: AFRICANOS DESCENDEM DE ANCESTRAL AMALDIÇOADO POR NOÉ. ISSO É FATO. O MOTIVO DA MALDIÇÃO É A POLÊMICA. NÃO SEJAM IRRESPONSAVEIS TWITTERS rsss Fui alvo de milhares de pedradas, sapatadas, raquetadas, "twittadas", e ainda virei matéria de mídias como UOL, etc.
O que gostaria aqui de explanar, explicar e logo depois DENUNCIAR é algo grotesco e absurdo!
Primeiro a Explanação:
Gn. 9:22-25 - E viu Cão, o pai de Canaã, a nudez do seu pai, e fê-lo saber a ambos seus irmãos no lado de fora. Então tomaram Sem e Jafé uma capa, e puseram-na sobre ambos os seus ombros, e indo virados para trás, cobriram a nudez do seu pai, e os seus rostos estavam virados, de maneira que não viram a nudez do seu pai. E despertou Noé do seu vinho, e soube o que seu filho menor lhe fizera.E disse: Maldito seja Canaã; servo dos servos seja aos seus irmãos.E disse: Bendito seja o SENHOR Deus de Sem; e seja-lhe Canaã por servo. Alargue Deus a Jafé, e habite nas tendas de Sem; e seja-lhe Canaã por escravo..
No texto acima temos a citação bíblica onde Noé amaldiçoa o descendente de Cão, ou seja, toda a sua descendência, pois Canaã era o mais moço. Canaã representa diretamente a descendência de Cão representando todos os seus filhos.
Gn.10:6 - E os filhos de Cão são: Cuxe, Mizraim, Pute e Canaã.
Acima vemos os filhos de Cão. Entre eles Cuxe. Veja abaixo a citação do Historiador Hebreu:
Flavio Josefo dá conta da nação de Cuxe, filho de Cam e neto de Noé : "Para um dos quatro filhos de Cam, o tempo não para toda a mágoa o nome de Cush; para a Etiópia , sobre o qual reinou, são ainda menos Neste dia, tanto por si e por todos os homens na Ásia , etíopes chamados. "(Antiquities of the Jews 1.6). ( Antiguidades dos Judeus 1,6).
Bem, citando a bíblia e a história, a veracidade sobre a postagem. AFRICANOS DESCENDEM DE CÃO, FILHO DE NOÉ.
Pois bem, há duas coisas que precisam ser analisadas nessa guerra argumentativa. Primeiramente não vejo nestas palavras do pastor Marco Feliciano uma declaração explicta de racismo como quer a mídia. Há dezenas de vídeos do pastor Marco Feliciano, muitos deles postados no youtube, e em nenhum se percebe esse suposto racismo alegado pela mídia eletrônica. Era de se esperar que esse suposto racismo do deputado possuísse um histórico. Ele parece não existir! Em segundo lugar, o que é de fácil percepção é que o deputado, enquanto pastor, apenas repete ou perpetua uma interpretação equivocada que se popularizou entre os evangélicos neopentecostais – A DOUTRINA DA MALDIÇÃO HEREDITÁRIA! Há sim, um lastimável erro doutrinário fundamentado em uma flutuação teológica!
Entre os anos de 1990 e 2000 presenciamos uma verdadeira enxurrada de ensinos heterodoxos no meio do arraial evangélico. O ensino sobre “maldições de famílias” ou “maldição hereditária” despontou como sendo um dos principais. Multiplicava-se pelo Brasil a fora Seminários e mais Seminários enfocando esse assunto. Na verdade a doutrina da Maldição Hereditária se tornou uma paranóia no meio das igrejas neopentecostais. Por mais de uma vez assisti a cultos onde pregadores de renome nacional conclamavam os crentes a “quebrarem maldições que estavam sobre suas vidas”. A idéia por traz desse ensino era a crença de que alguma maldição não quebrada estava por traz da falta de prosperidade na vida do crente. A coisa se afastou tanto da Bíblia a ponto de muitos pregadores passarem a exigir dos fiéis a prática da regressão psicológica ou espiritual como condição de uma “libertação” plena. Foi detectado pelos apologistas que de 5.000 casos de práticas regressivas, cerca de 1.200 atestaram experiências de vidas passadas . Em palavras mais simples, a doutrina da maldição de famílias acabou por abrir porta para uma velha prática já há muito conhecida no espiritismo – a doutrina da reencarnação.
Apesar do bombardeio pesado por parte de muitos apologistas brasileiros, a doutrina da Maldição Hereditária ou de Famílias não acabou. Diminui a sua intensidade, mas vez por outra dar sinal de querer reerguer-se. Os apologistas Paulo Romeiro e Ricardo Gondim, somente para citar os mais aguerridos nesse combate, através dos seus escritos provocaram profundos ferimentos nessa teologia. Todavia observa-se que os apologistas não podem baixar a guarda sob pena de se constatar a ressurreição desse monstro que tanto males causou à igreja evangélica. É preocupante verificarmos que renomados escritores evangélicos continuem fazendo apologia dessa doutrina.
Ricardo Gondim observa que: “Umas das mais insidiosas heresias que tem surgido na igreja nesses últimos dias diz respeito a quebra de maldições familiares. Acredita-se que os pecados, alianças e padrões estabelecidos pelos antepassados podem exercer maldições sobre filhos, netos até a terceira ou quarta geração. Alguns, mais cautelosos, quebram maldições regredindo até à décima geração. O texto mais usado é êxodo 20.5 (...) Ora, se é Deus quem age, visitando a maldade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração, como se quebra uma maldição de Deus?, certamente não é com uma repreensão verbal. A maldição da lei foi quebrada na cruz do Calvário e todos os que se apropriam da vitória de Cristo ficam livres de todo débito que tinham acumulado contra eles (Cl 2.14-15).
O que logo se percebe é que os fundamentos hermenêuticos, exegéticos e históricos defendidos pelo pastor, ora deputado, para justificar em seu texto a suposta doutrina da maldição hereditária não encontra apoio na história e nem mesmo na própria Bíblia. Ele diz citar a Bíblia e a história (o historiador judeu Flávio Josefo) para provar que os africanos descendem de Cão (Cam), filho de Noé. A argumentação do deputado, ora pastor, equivoca-se quando não percebe que Noé amaldiçoou Canaã, filho de Cão e não o próprio Cão (Cam). Se a raça negra não descende de Canaã, mas de Cão, então como poderia a maldição atingi-la? Não deveria ela atingir somente aos descendentes de Canaã, conforme narra o texto bíblico? E mais: porque somente os negros estariam sujeitos a maldição e não outros povos descendentes de Cão, tais como os egípcios, líbios e sul-arábios?
O expositor bíblico Warren W. Wiersbe, respeitado erudito, põe isso em destaque quando diz: “É uma pena que esse breve discurso tenha sido distorcido e interpretado incorretamente como uma “maldição”, pois aquilo que Noé disse teve muito mais caráter de profecia de um pai sobre seus filhos e netos. A palavra “maldição” só é usada uma vez, mas refere-se a Canaã, filho mais novo de Cam, e não ao próprio Cam. Isso indica que Noé estava descrevendo o futuro de seus filhos e de um de seus netos tomando por base o que via no caráter deles, algo não muito diferente do que Jacó fez antes de morrer (Gn 49)
[...] Há duas idéias equivocadas que devem ser esclarecidas. Em primeiro lugar, os descendentes de Cam (Cão) não eram membros da raça negra, mas sim caucasianos, de modo que não há qualquer fundamento para a instituição da escravidão nessa chamada “maldição de Canaã. Em segundo lugar, apesar de seus caminhos maus, alguns desses povos descendentes de Cam formaram grandes civilizações avançadas, como a dos babilônicos, dos assírios e dos egípcios”. Esse fato é visto ainda por outros expositores. De acordo com Bob Deffinbaugh “visto dessa maneira, é impossível ver qualquer implicação desta passagem para a subjugação dos povos negros da terra. Cam não foi amaldiçoado nesta passagem, mas Canaã. Canaã não foi o pai dos povos negros, mas dos cananeus que vieram na Palestina e que ameaçavam os Israelitas”.
É sempre perigoso assumir um posicionamento radical sobre qualquer assunto, quer seja ele de naturea "teológica" ou "científica" tomando como fundamento apenas suposições. O Nazismo alemão, responsável por uma das maiores trágédias da humanidade - o extermínio de seis milhões de judeus, - apoiou-se no mito da pureza da raça "Ariana" para justificar esse genocídio.
De com a Enciclopédia Judaica Tudo começou assim: No ano de 1808, Friedrich von Schlegel, célebre estudioso do sânscrito (católico casado com filha de Moisés Mendelssohn, Dorothea), observou, no decurso de suas pesquisas filológicas, certa proximidade entre o persa e o sânscrito de um lado e as línguas teutônicas (alemão, sueco, holandês, etc) de outro. A partir dessas observações inteiramente acidentais e de outras feitas por vários filólogos, elaborou finalmente uma hipótese complicada segunda a qual essas línguas "aparentadas" derivariam de uma língua ancestral comum, o "ariano", supostamente falada por um povo chamado "ariano", que habitava a terra de "Ariana". Nem é preciso dizer que o "ariano" era uma língua perdida e esquecida, os próprios "arianos"  haviam desaparecido no bojo da história, e a terra de "Ariana" era mencionada superficialmente no Zend Avesta, livro das escrituras semimíticas do Zoroastrianismo persa, escrito por volta do ano de 1000 a.E.C. Não há, porém, qualquer indicação de onde estaria situada.
Foi nesse hipóteticos arianos, habitantes de um país hipotético chamado Ariana, que falavam uma língua hipotética, o ariano, que os anti-semitas do século XX, entre os quais estavam, professores, jornalistas, e panfletários demagógicos alemâes, foram buscar as fontes de sua nobreza ancestral e de seu orgulho de fazer parte de uma "raça superior" da humanidade" (volume 5, p.36).
Fica, portanto, o alerta para que nínguem fundamente supostas verdades "teólogicas" tomando como base suposições e interpretações equivocadas do texto bíblico.
Não esqueçamos que Deus não faz acepção de pessoas (At 10.34) ) e que um só fez toda a raça humana! (At 17.26). No Senhor não existe branco, preto, pardo ou amarelo, mas um único povo comprado pelo sangue de Jesus!

Fontes consultadas:
www.uol.com.br. Acesso em 31 de março de 2011.
www.peticaopublica.com.br. Acesso em 01 de abril de 2011.
www.oglobo.com.br. Acesso 01 de abril de 2011
www.terra.com.br. Acesso em 01 de abril de 2011.
www.ogalileu.com.br. Acesso em 01 de abril de 2011.
HUNT, Davi. A Sedução do Cristianismo. Ed. Chamada da Meia Noite, 2005.
GONDIM, Ricardo. O Evangelho da Nova Era. Editora Aba Press.
WIERSBE, W. Warren. Pentateuco – comentário bíblico expositivo.
http://www.bible.org/. Acesso 01 de abril de 2011.
Enciclopédia Judaica

Em um outro texto estarei analisando a suposta relação homossexual praticada por Noé.
Até lá
Pr José Gonçalves